terça-feira, 30 de setembro de 2014

Ao fundo da calçada a rua estreita-se e dilata. O olhar cadafalso o ritmo admite. A braguilha mão-dentro e o largo a erecção grossa da prosa masturbam violentamente. Entre a pausa o músculo o pénis interdito alastra. O sistema desarruma eriçando a curva e do inferno entorna-se a água.

Luisa Demétrio Raposo
A vulva um poço violento onde nasce libidinosa a escrita e no contorno da carne distendida e escancarada a leitura que a boca desata na imagem, incindindo sobre o sexo infindável e quente onde a língua lateja e escreve sombras até encontrar circunstantes. Fode-se. Bebe-se de entre o lodo que atraca as seivas. Teias sempre abertas.
Ao lume lê-se baixinho, o sentir demorado nas orbitas as coxas. Extrair fogo é uma arte porque a ostra pressente sempre o sal e, somente ela despe ...
a língua que pouco a pouco aresta.
Todas as línguas possuem serpentes que no sexo se arrastram ora ligeiras oram suaves e tremem à carne erecta e masturbam a terra. O cuspo coberto de hóstias ou de sémen. Abandonei-me. O orgasmo caiu-me do ventre. A elanguescer.
Na fenda fica fogo, a minha afeição e o incêndio prossegue com o texto. O coração perde-se lá do alto no momento da micção. A narrativa atinge-o como um carrasco e na sua base desapareci. O bombear dá-se ao encontrão.
Aberta a porta e nos ruídos saem os gritos.
Eu, o ponto vazio. Lentamente.


Luísa Demétrio Raposo

retirado do livro de contos.

*foto Franz von Stuck, The Sin 1803

segunda-feira, 29 de setembro de 2014


 incêndio a intempérie a violência que transforma em margens o cemitério que me habita e onde somente o eu-deserto ressuscita. o grito a língua contínua mata quebra e extermina. a tempestade ascende ignóbil na demência o ser o ter e o sido embrulham-se-me. afloração monstruosa vem dum raio fundamente. Sol a violação o sangue em composição longa e larga na decifração e faz a carne obesidade grossa de um defecar inominável. ergue e estanca o só finito.
Luísa Demétrio Raposo

terça-feira, 23 de setembro de 2014




a geometria do meu reflexo devorando o negro que a mão escreve. vivo. mas não sei escrever. reflexo de calor húmido. o rasgar na lama abominavelmente bebe. crescente a maré solta penetra todos os lugares em gritaria.

Luisa Demétrio Raposo
 a sentir-me incompleta.

domingo, 14 de setembro de 2014

"mais ousadia e menos consciência. a consciência é a gaiola que nos aprisiona os sentidos e condiciona o acto de criar algo, e quem não ousa habita uma frustração ilimitada."

Luísa Demétrio Raposo

domingo, 7 de setembro de 2014

a tinta


ao fundo do coração uma rua invulgar prosa o escuro e o que sou bombardeia violentamente a escuridão repleta.
queima o lume a boca que na escrita rasga come furtivamente une e destila a palavra obscena. poesia. quando penetro a carne e cuja saída não passa de uma exaltação igual à minha.
na cabeça funda a obscenidade, escrever ora e sem o saber continuar a gozar de mão segura.
 
 
Luísa Demétrio Raposo


*Human heart by Arnold Hohmann

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

o corpo cadáver é o que me separa de tudo no mundo. é o circuito fechado do perverso que me separa nos outros, sempre, sempre. a perspectiva enforca e no barulho não há nada pior que ter que ser antes de escrever. o suor delineado do sangue a escorrer, ilustre. é a morte de todos os esforços e de todas as gritarias nos lugares onde a minha calma cedeu e partilhou dela. a aflição que sempre acabava por me descontrolar os lábios, exibia-se muito e por isso pus-lhe uma mordaça. delirava puerilmente deixando-me arrastar pelo pavor de todos os horrores que estão vivos e são de origem orgânica e humana que dilaceram e se apossam nos delírios causando maleitas e outros tantos estados febris. ainda a convenção intolerável feita de contas e números.
caí no abandono das faculdades mentais, já não temo a morte neste momento e nem vou falar de infelicidade quando me precede o vício em escrever palavras, erectas, ausentes e sem universo entre o papel e a tinta atenta que chama a atenção obscena. o deboche inverso descreve. não temo a hostilidade do lume nem ferir-me no fogo e na cabeça que um dia já foi minha, entrei. a exaltação igual a mim, reflexo de um inferno infindável e eu à altura do que tanto me oprimia. escolhi arder, escrever, a ter que voltar ao mundo enorme. (...)



Luisa Demétrio Raposo
* retirado do livro dos contos