domingo, 26 de abril de 2020

Nunca mais apareci num evento público. Fiquei cansada de toda a enfermidade, da ópera ao molde. Da competição e eu nunca fui atleta.
Eu sou mais bicho, feia, má. Pelos de aço. Uivo. E não faço depilação em rebordo do prato.
Eu sou aquele evento literário, aquele género de mistura que não devem jamais voltar a permitir-se.
Escrever é secreto, viuvez. Luto. O longe. Um estrondo que mata à altura do peito.
Eu falo. E o meu falo é maiúsculo. Desordeiro. E está sempre nu da cintura para baixo. Aguentar, porque estou só e porque é avermelhado e é de carne. E insisto na erupção.
O braço narra sem custos. A cor profunda nos buracos. O fósforo. O aroma da terra torrada, deserta, pronta a encher.
Do poema saí-me o útero. A boca bem aberta. Dois buracos sem nome e na mistura de ambos, estica-se o passageiro em espera.
Da obscenidade ao realismo, apertar. É achar-me, sentir.

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